Havia um louco na cidade. Residia na praça central da
cidade, que muitos já chamavam de metrópole, mas de metrópole só tinha vontade.
Havia sim um louco na cidade, ele mesmo se dizia louco. A gente toda com o
decorrer do tempo passou a cuidar dele; claro, levando comida que não tinha
mais serventia ou então uma blusa que não servia ou o filho não gostava mais,
porém cuidado mesmo ele nunca recebeu, mesmo que na cidade houvesse um hospício
para trata-lo.
Sempre achei que por fim ele gostasse mesmo de ser louco. E
as pessoas gostavam também. Só era considerado morador da cidade se no mínimo
uma vez tivesse rido de alguma loucura dele. Aliás, quando o assunto acabava
nas rodas de conversa, sempre era bem-vinda alguma lembrança de algo que o
louco disse ou fez, mesmo que a história já tenha sido contada inúmeras vezes
antes.
Uma vez perguntei de onde ele era, ele me respondeu que
vinha de lá, e então brinquei e tornei a perguntar: “como a menina de lá de
Guimarães Rosa?”, e ele disse que gostava de Rosas, mas nunca tinha sentido o
cheiro de nenhuma.
É, realmente, havia um louco na cidade. Até quando os
jornais ficaram sabendo disso. Eis que de uma hora pra outra o louco se transformara
em celebridade, e sua loucura fora levada para todos os cantos do país.
Havia um louco de verdade em uma cidade. Foi o que disseram
umas pessoas que tratavam de problemas de insanidade mental, e logo se
prontificaram, em nome dos direitos humanos, a tratar dessa pobre alma indefesa
e incapaz.
Em questão de meses o louco que vivia na praça passou a
celebridade e a paciente de uma clínica psiquiátrica.
Não há mais louco na cidade. O slogan em defesa da sanidade,
saúde e da ordem do sr. Prefeito trouxe o sonhadíssimo título de metrópole a
cidade. Quem conhecia o louco como a gente, não soube se ficava triste ou
contente; por um lado o louco não era mais louco, e por outro, que ninguém
assumia em público, era que na verdade a sanidade da gente dependia dele, assim
como as risadas.
Um ano depois o louco voltou para a metrópole, quer dizer, a
pessoa voltou a metrópole.. Logo todos correram para saudá-lo e para ter
certeza que estava “normal”. Aparentemente sim. Inclusive chegara até mim e
disse que agora sabia quem era Guimarães Rosa, e tinha lido livros de outros
autores também como Machado de Assis.
Passaram-se um ou dois dias e encontrei-o sentado no banco
da praça cabisbaixo, banco cujo rendeu boas risadas e sorrisos de todos os
cidadãos da metrópole. Perguntei o que havia acontecido, ele me respondeu que
achava que o tratamento não havia tido efeito, porque ele ainda continuava
louco, pois disseram pra ele na clínica que ele iria ser feliz, morar em uma
casa grande e bonita, acharia uma garota legal e se tornaria o rapaz mais
inteligente da metrópole. Eles não mentiriam, continuou, eu que não sou capaz
de entender tudo isso, pra mim, quando fui pra clinica achei que era pra me
separar das pessoas que não pensavam muito bem, só que lá eles me convenceram
que eu era o louco e não as pessoas, me desculpe, mas esse mundo é louco sim,
você é louco também, eu sou feliz.
Há loucos na cidade.
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